Sustentabilidade Fiscal e os Desafios Jurídicos e Tributários no Brasil Pós-Pandemia
Nos últimos anos, o Brasil enfrenta o desafio de equilibrar suas contas públicas em meio a um cenário de alta dívida e crescente demanda social por serviços públicos. Este equilíbrio não é apenas uma questão econômica, mas também jurídica, pois o aumento de tributos e a gestão fiscal refletem diretamente na vida dos cidadãos e no papel do Estado como garantidor de direitos. O cenário de aumento da carga tributária e da desvalorização do real também impõe dificuldades adicionais aos brasileiros, impactando o poder de compra e a capacidade de investimento tanto das empresas quanto das famílias. A título de exemplo, a “queridinha” nota de cem reais dos brasileiros que foi criada pela Lei nº 8.880, de 27 de maio de 1994, esse ano atingiu a equivalência de cerca de R$13,28, ainda nessa lógica, a Lei 9.032/1995 definia o salário-mínimo em R$100,00, uma realidade distante dos tempos atuais, em que já temos outra nota superior à de R$200.
1. O Contexto Jurídico e a Necessidade de Sustentabilidade Fiscal
A sustentabilidade fiscal é um conceito fundamental que envolve o uso responsável dos recursos públicos que garantem ao Estado poder honrar com seus compromissos sem comprometer a capacidade financeira das futuras gerações. Todavia com o aumento das despesas públicas devido à pandemia de COVID-19, especialmente em saúde e assistência social, o governo brasileiro foi forçado a ampliar sua dívida pública, que já se encontrava em patamares elevados. Esse aumento de dívida impulsionou novas discussões sobre a necessidade de reformas fiscais e ajustes na legislação tributária, de modo a gerar receita suficiente para cobrir os gastos públicos sem comprometer o crescimento econômico do país.
A Lei do Teto de Gastos (Emenda Constitucional nº 95/2016) é um exemplo de medida jurídica que visa conter o aumento das despesas públicas, limitando os gastos federais ao valor do ano anterior, corrigido apenas pela inflação. Embora esta emenda tenha sido uma tentativa de controle fiscal, alguns especialistas apontam que ela gera restrições ao orçamento público, dificultando investimentos necessários em áreas como educação e saúde.
2. Aumento da Carga Tributária e Legislação Recente
Nos últimos anos, o Brasil adotou diversas medidas para aumentar sua arrecadação. Um exemplo é o recente aumento do “Imposto sobre Produtos Industrializados” (IPI) para bebidas açucaradas, via Decreto nº 10.254/2020, que embora voltado à saúde pública, representa um aumento na carga tributária ao consumidor. Entretanto, à medida que sem dúvidas é a mais relevante para o futuro do Brasil se trata da recente Reforma Tributária, consolidada pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023, introduzindo mudanças significativas no sistema tributário brasileiro, focando na simplificação da tributação sobre o consumo. Um dos principais pilares da Reforma Tributária é a substituição dos tributos atuais que incidem sobre o consumo – como IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS – por três novos impostos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), destinado aos Estados e Municípios, a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS), de competência da União. Essa unificação visa simplificar a arrecadação e evitar a complexidade de apuração dos tributos atuais, marcada por regimes distintos e alíquotas variadas que oneram o ambiente de negócios. Outro aspecto importante da reforma é a aplicação do princípio do destino, onde o tributo será cobrado no local de consumo do bem ou serviço, e não no local de origem. Essa mudança busca mitigar a guerra fiscal entre os estados e municípios, promovendo uma arrecadação mais justa e equilibrada.
No entanto, os efeitos reais dessa transformação dependerão da regulamentação detalhada e da adaptação das leis complementares que regerão o IBS, CBS e o IS, bem como das alíquotas e regimes diferenciados para setores específicos. Um dos objetivos centrais da reforma é tornar a tributação mais justa e menos regressiva, aplicando o princípio do destino – ou seja, a cobrança de tributos no local de consumo, em vez do local de produção. Essa mudança tem o potencial de mitigar a guerra fiscal entre os estados e municípios, promovendo uma arrecadação mais equilibrada e beneficiando regiões consumidoras que, até então, eram desfavorecidas pelo modelo de tributação na origem Essas mudanças são vistas com cautela, pois, em um contexto de crise econômica, aumentos na carga tributária podem dificultar o crescimento econômico Brasileiro.
3. Desvalorização do Real e o Impacto Jurídico-Fiscal
As medidas tomadas pelo governo não impediram a desvalorização do real, que sofreu uma queda de aproximadamente 30% frente ao dólar entre 2020 e 2022, exercendo uma pressão sobre os preços de produtos importados e, consequentemente, sobre a inflação. Com o aumento dos custos de insumos importados, diversos setores têm registrado aumentos de preços, especialmente em áreas como tecnologia e bens de consumo, que dependem de importação. Esse cenário torna-se mais grave para as empresas que possuem dívidas em moeda estrangeira, aumentando o risco de inadimplência e gerando uma instabilidade econômica que pode impactar negativamente a arrecadação tributária do governo.
Ademais, a desvalorização cambial e a alta dos juros básicos, como a taxa SELIC, afetam diretamente o custo de financiamento da dívida pública. Em 2021, por exemplo, o Banco Central elevou a taxa SELIC para conter a inflação, mas essa medida aumentou também o custo dos juros pagos pelo governo brasileiro sobre sua dívida pública.
4. Alternativas Jurídicas para uma Reforma Fiscal Sustentável
A reforma fiscal sustentável no Brasil exige uma abordagem equilibrada entre responsabilidade fiscal e proteção dos direitos dos cidadãos. Algumas alternativas incluem:
• Reforma Administrativa (PEC 32/2020): Busca modernizar a administração pública e reduzir gastos com a máquina estatal, de modo a tornar o gasto público mais eficiente sem necessariamente aumentar impostos. Ademais o TCU já emitiu alerta sobre risco de “shutdown” da máquina pública até 2028, com o crescimento dos gastos públicos e a defasagem em investimentos em infraestrutura, saúde e educação.
• Reforma Tributária: Um sistema tributário mais simples e transparente pode ajudar na redução de custos operacionais para empresas e facilitar o cumprimento das obrigações fiscais, contribuindo para um ambiente econômico mais favorável, embora tal ação já tenha sido executada, apresentou saliências que serão reguladas à parte, não trazendo muitas garantias até o presente momento. Além da complicação do período transacional entre esses impostos já que o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) – coexistirão com os tributos antigos, como ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI.
5. Conclusão
A sustentabilidade fiscal é um objetivo que requer medidas coordenadas e cuidadosas para evitar impactos negativos na economia e no bem-estar da população. Medidas como o aumento de impostos e a contenção de despesas são importantes para manter o equilíbrio fiscal, mas é necessário que essas iniciativas sejam implementadas com sensibilidade às necessidades sociais e econômicas do país. O Brasil ainda precisa encontrar um modelo que permita conciliar a estabilidade fiscal com o crescimento econômico e a garantia dos direitos fundamentais.
O cenário atual demanda não apenas políticas fiscais e monetárias adequadas, mas também uma visão e aplicação jurídica que equilibre a responsabilidade fiscal com a justiça social. Uma reforma fiscal sustentável, que inclua revisões no sistema tributário e maior eficiência na gestão pública, pode ser o caminho para assegurar o desenvolvimento econômico e a melhoria da qualidade de vida dos brasileiros.